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Andressa Alves superou 'esquecimento' para chegar à terceira Copa do Mundo no melhor momento da vida

Carolina Alberti e Luiza Sá Do UOL, em São Paulo e no Rio de Janeiro Chris Hyde/FIFA via Getty Images

'Viver um jogo de cada vez' e 'não pensar no depois'. Esses foram alguns dos ensinamentos que a atacante Andressa Alves colocou na mala antes de embarcar para a Copa do Mundo da Austrália e da Nova Zelândia, a terceira de sua carreira.

Forjada pelas ruas, onde jogava bola com os meninos, ela pisou num clube - o Juventus, da Mooca - pela primeira vez aos 17 anos. Após pouco mais de uma década, ela está entre as 23 jogadoras que buscam um título inédito para o Brasil.

E pensar que essa viagem rumo ao terceiro Mundial da carreira quase não aconteceu. Esquecida pela técnica Pia Sundhage por aproximadamente um ano, Andressa ganhou sua chance em abril deste ano - após sucessivos cortes entre as convocadas - brilhou contra a Inglaterra e, meses depois, chorou com a esposa Francielle ao ouvir seu nome na lista.

Batalha vencida e no melhor momento da carreira, a camisa 7 quer colocar a primeira estrela no escudo da seleção brasileira, e também coroar a carreira de Marta.

Chris Hyde/FIFA via Getty Images

É a Copa que estou mais preparada psicologicamente. A gente tem que viver cada jogo, aquele momento, sem pensar no depois. E é o melhor momento da minha carreira, vou poder ajudar bastante a seleção"

Andressa Alves, atacante da seleção brasileira

Christopher Lee - UEFA/UEFA via Getty Images

O gol que mudou tudo

Sorte? Boa leitura? Predestinada? O fato é que foi o pé direito de Andressa Alves que aproveitou a falha da Earps, empatou o jogo contra a Inglaterra, nos acréscimos, e levou a Finalíssima para os pênaltis - que terminou com triunfo britânico. Foi naquele Wembley lotado que a atacante colocou uma pulga atrás da orelha de Pia.

Pouco depois, vieram os treinos na Granja Comary, e a expectativa por ter seu nome na lista. Afinal, conforme contou Andressa, a comandante da seleção brasileira não é de dar spoilers.

Sabia que só um jogo não importava muito para ela [Pia]. Teve a semana de treinos na Granja, e tentei aproveitar ao máximo todos os dias para mostrar que eu merecia estar na Copa do Mundo, por toda a temporada que eu tinha feito com a Roma".

Após o período de treinamentos em Teresópolis, a atacante voltou para São Paulo e, ao lado da esposa, e ex-jogadora, Francielle, assistiu à convocação. Ao ouvir seu nome, a paulista de 30 anos colocou todos os sentimentos para fora.

"Foi um momento de desabafo, de 'eu consegui', 'nós conseguimos'. Trabalhei em silêncio, fora dos holofotes e não desisti em nenhum momento de estar na Copa. Foi um momento especial, deu para demonstrar a emoção que foi estar na minha terceira Copa do Mundo", recordou.

Andressa Alves conta a saga pela convocação para a Copa

A convocação

Quando acabaram as meias, o coração já foi apertando, mas quando escutei meu nome, não ouvi mais nada. Foi só aquele momento de chorar de alegria mesmo, porque estar na Copa pela seleção é maravilhoso"

Andressa Alves, atacante da seleção brasileira

Não me sentia assim nem quando eu jogava [futebol]. Eu ficava gelada, começava a suar. Foi um processo difícil, mas que eu nunca deixei de acreditar, e nunca deixei que a Andressa também deixasse de acreditar"

Francielle, ex-jogadora da seleção e esposa de Andressa Alves

Chris Hyde/FIFA via Getty Images Chris Hyde/FIFA via Getty Images

Saideira de Marta e luta pela primeira estrela

Uma taça para a Rainha. Este é o discurso de vários nomes da seleção brasileira que estão na Copa 2023, a última de Marta, e Andressa Alves não foge à regra. A atacante tem a camisa como uma de suas inspirações e diz que o Brasil está unido para colocar a seis vezes melhor do mundo no lugar mais alto do pódio desde as Olimpíadas de Tóquio.

"Nas últimas Olimpíadas a gente já tentou fazer isso, porque era a última da Formiga também. Não conseguimos, mas estamos unidas para ganhar essa Copa do Mundo. Sabemos que é importante para a Marta, para coroar a história dela. Não dá para terminar a carreira sem uma Copa do Mundo. É muito injusto para o futebol. Vamos fazer de tudo", disse Andressa.

Além de proporcionar uma "saideira de luxo" para Marta, o título seria o primeiro da seleção feminina na história. A chance de decorar o escudo, que pela primeira vez em um Mundial feminino, aparece sem estrelas.

Andressa fez parte do grupo de jogadoras que lutou pelo direito de a seleção feminina carregar a própria história. Ela espera, porém, que o período sem estrelas seja curto.

"Foi uma briga interna sempre que estivemos aqui, quando estava a Marta, a Cris [Cristiane], a Formiga, eu, a Bárbara. A gente não queria carregar uma estrela que não foi conquistada por nós. Ficamos felizes que o Brasil é cinco vezes campeão, mas é mérito deles. A gente queria um uniforme especial para também buscar a nossa estrela. A CBF entendeu que era uma coisa importante para termos a nossa própria identidade. Está legal esse escudo, mas falta uma estrelinha para ficar mais bonito", explicou a camisa 7.

Justin Setterfield/FIFA via Getty Images Justin Setterfield/FIFA via Getty Images

Sofrimento ontem, recompensa hoje

A retirada das estrelas "deles" foi apenas um dos avanços que a seleção brasileira teve para esta Copa do Mundo. Para buscar a taça na Austrália e Nova Zelândia, o Brasil teve uma longa preparação, voo fretado, uniforme e traje de viagem personalizados e a maior delegação de sua história.

Vemos que as coisas estão mudando. Aquela briga que tivemos lá no passado, que as meninas sofreram, acho que a recompensa está chegando. Isso é importante. Estou feliz em fazer parte desse processo, ver que a mudança está acontecendo. Agradecer à CBF por tudo que está fazendo pelo futebol feminino, que era tudo que a gente sonhou um dia".

Andressa acredita que "o tratamento [que a seleção recebeu] agora é o que o masculino sempre teve". Porém, a história é outra quando se compara estrutura, dinheiro e atenção dos clubes.

"No masculino, eles vivem em outro mundo, têm outras condições financeiras. [...] É totalmente diferente, questões estruturais dos clubes mesmo. A Roma é um grande clube, mas o masculino é diferente do feminino. Vai ter sempre essa desigualdade", disse Andressa, que torce por mais igualdade:

"A gente espera que chegue a ser um pouco mais igual, mas sabemos que é complicado. O masculino sempre voa fretado, feminino não é assim. É uma luta nossa e que a gente espera que um dia mude".

Andressa comenta evolução do futebol feminino: 'recompensa está chegando'

Acho que o futebol feminino é uma luta só das mulheres, parece que a gente está lutando sempre sozinha"

Andressa Alves

Chris Hyde/FIFA via Getty Images Chris Hyde/FIFA via Getty Images

A luta das 'bocudas'

Andressa não é daquelas que apenas observa e torce por melhorias, pelo contrário, ela não teme ser "bocuda" e falar sobre questões de dentro, e fora, das quatro linhas.

"Eu sempre bati de frente com as coisas que eu não concordo, foi algo que surgiu naturalmente. Com o passar do tempo, fui melhorando os meus argumentos, o jeito de falar também, não ser só agressiva. Me ajudou a ter mais confiança para falar sobre as coisas", contou a atacante.

E os xingamentos e críticas por falar o que pensa não abalam a jogadora, que prefere escutar quem a apoia e incentiva.

"É super confortável. Como mulher e atleta, a gente tem um papel importante, uma visibilidade grande. Temos de brigar pelas coisas, lutar de uma forma justa, saber falar. Não adianta brigar e não ter argumento. Isso é importante. Sempre tem o xingamento, mas a maioria são palavras incentivadoras. Ficam felizes com o nosso posicionamento. Isso é o que me motiva a continuar brigando pelas causas do futebol feminino, contra racismo, homofobia", completou.

Andressa Alves fala sobre papel fora das quatro linhas: 'Sempre fui bocuda'

Arquivo Pessoal

Direito de amar

E as lutas de Andressa aparecem também em sua vida pessoal. A atacante passou os últimos 11 anos de sua vida ao lado da esposa Francielle, ex-jogadora da seleção brasileira e hoje comentarista da CazéTV.

"Aceitação eu sempre tive. Estava tranquila comigo mesma, meus pais sabiam, me apoiavam, os pais da Fran também", relatou Andressa.

Abraçada pelos familiares, Andressa Alves teve receio de perder patrocinadores, mas resolveu colocar o amor em primeiro lugar e abrir a porta do armário.

"Era uma questão do medo de perder algum patrocínio, de perder alguma empresa. Quando eu e a Fran decidimos nos assumir, falamos que era mais importante do que qualquer coisa dessas. Poderíamos estar ajudando pessoas que têm esse medo também a se libertar. Porque você tem o direito de amar quem quiser, independente do gênero", falou.

"Depois que a gente se assumiu publicamente, muitas pessoas começaram a mandar mensagem dizendo que estavam felizes, que também estavam se assumindo, que tinham a gente como espelho. Isso é muito importante, porque o amor é o que importa nesse mundo que está tão complicado", completou a jogadora.

O que todos esperam é que a relação não seja abalada caso Andressa dê um beijo na taça da Copa do Mundo enquanto Fran está no Brasil.

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